Sobre as mulheres
O mal que a sociedade fez, a nós mulheres, assim como fez aos homens, foi a imposição de um único papel social, de um único modelo. Ao contrário dos gregos que, mesmo sendo bastante opressora com as mulheres, as representavam em papéis muito distintos, como a guerreira, a mãe, a esposa ciumenta, a mística, a sedutora, etc, nos foi dado um lugar restrito, confinado, sem opção, o lugar de santa, dona de casa, esposa casta, mãe. Mas e o lugar dos homens era um bom lugar?
O homem, mesmo ocupando o papel de opressor, também sofria a restrição de um papel social excessivamente rígido: homens não choram, são provedores da família, têm que ser viris, etc. E a luta das mulheres, ao contrário de ser contra os papéis sociais opressores, se tornou, em uma determinada perspectiva, contra os homens.
Ainda permanece nas lutas que travamos um ranço, uma reatividade, uma vingança, não somente contra os homens, mas contra a maternidade, os trabalhos domésticos, o cuidados com os filhos, a fragilidade, a sensibilidade, ou tudo que nos lembre aquilo que um dia fomos. E terminamos nos tornando um ser híbrido, que nasceu não de uma ação, mas de uma reação, um ser que nega a si mesmo, nega seu corpo, seus hormônios, suas lágrimas pré menstruais, e busca cada vez mais conquistar espaços sociais, honras, que nunca fizeram felizes aos homens e hoje oprime e apaga mulheres cada vez mais sozinhas e poderosas. Que percebem, tarde demais, devido ao limite de nosso relógio biológico, que não era nada daquilo que queriam.
Quem somos mulheres de hoje? Mulheres cada vez mais independentes, mas talvez excessivamente independentes, ou oprimidas pela independência. Por isso mulheres maravilhosas, incríveis, criativas, fantásticas, belas, mas sozinhas, aprisionadas por um plano, um projeto de vida construído em reação a opressão a que fomos submetidas. A hora agora nos exige um novo passo: não se trata mais de tomar um lugar, mas de criá-lo: qual o lugar de nossa diferença, qual o lugar que nos faz florescer? Precisamos construir um espaço que nos caiba e este espaço deve ser necessariamente complexo, como nosso corpo, nossa potencialidade. A mulher expande pra dentro, mas também explode pra fora em forma de broto, filho criação, invenção.
Viviane Mosé
8 comentários:
mas diga ae, o que vc acha de tudo isso?
...oprimidas pela independência...
A opressão se apresenta de diversas formas, até como "liberdade". Como fugir disso? Eis a questão! Creio que os termos "fraternidade", "solidariedade", "amor" tem algo a ver som a solução...
Acho que a gente é muito aficionado na idéia de se estabelecer padrões pra o que devemos ou não ser, pra classificar o mundo e nós mesmos. Isso me fez lembrar o café filosófico com ela, que vc gravou pra mim, onde ela dizia que a nossa sociedade fez a opção pela razão e não pelo corpo, no sentido da experiência. Acho que gastamos tempo de mais nos julgando e construindo uma imagem de ser, de ser livre, de ser mulher, de ser homem, de ser respeitado e etc., quando talvez fosse mais leve e mais terno se apenas procurássemos respeitar o que sentimos, dar ouvido a outros canais da nossa percepção com esse mundo que fossem mais respeitosos com a nossa própria natureza, menos mediados pela nossa obsessão por controle, daquilo que está absolutamente fora do nosso controle. Vejo uma ligação forte nisso porque acho que esses tabus entre o homem e a mulher também se construíram assim. Cada vez mais eu penso no feminino e no masculino como forças complementares e não opostas, que estão presentes em tudo no planeta, em maior ou menor proporção. Eu tenho meu lado feminino, como manifestação maior, e explicita, mas também carrego o masculino, ou não seria capaz de gerar um homem. Acho importante sempre relevar essa dualidade do mundo, que não é 8 ou 80, mas nós insistimos nisso. Ai surgem um monte de certo/errado, feio/bonito, pode/não pode... Sei que socialmente isso é importantíssimo, mas será que já não era a hora de sermos mais maduros culturalmente, entendendo essas complexidades? As vezes noto que a gente se oprime tanto, se exige tanto, se esconde tanto atrás desses padrões, e isso por outro lado não parece nos fazer mais feliz, pelo contrario, parece alimentar ainda mais a nossa pretensão, e por isso a nossa dor, e a nossa desilusão com nós mesmos e o mundo. Lembra dela dizendo sobre a mediação com o mundo dos gregos, que era pela arte, e a nossa pela verdade? Então, sei lá né, teve seus benefícios mas é bastante paranóica essa busca, sobretudo pq não tem fim.
Ai fico pensando pq a gente não consegue ser mais ponderado entre os extremos?
Acho compaixão uma atitude muito necessária também, Rubinho
acho q este deveria ser seu post no Blog!
vc escreve bem, gostoso, mais ou menos como você fala, dá vontade de ouvir!
Mas sabe ,vc diz que poderíamos "respeitar o que sentimos", "dar ouvido a outros canais" e tal, quando, na realidade, hoje damos mais ouvido a razão.
Como posso diferenciar dentro de mim o que vem da razão e o que vem dos sentimentos e outros canais?
Na verdade, td isso é muito fácil e bem resolvido no discurso, mas a gente sabe que a prática dessa história toda sempre deixa a gente as voltas com as tantas questões que a envolvem, que nos envolver. Por isso acho que a validade dessa conversa toda é despertar essa intenção, porque o caminho mesmo vai sendo construído como é possível. Porque é impossível prever, planejar como as coisas serão, não existe um método pra viver, a escolha certa, a postura certa, a atitude certa. Um lado meu adoraria que as coisas fossem assim e sente uma saudaaade de acreditar nisso! O outro mais pé no chão pede - Não pira, vai viver minha filha!
É sempre isso que sobra, viver, como for possível. Às vezes a gente trata isso como se fosse pouco, ás vezes como se fosse mais do que é, e o É da coisa em si, fica sempre no meio disso.
Mas sei lá, quanto à razão X sensibilidade, procuro tratá-las como iguais, um pouco na perspectiva de se complementarem, procurando não cair em exageros nem em uma, ou em outra. Acho que as duas em excesso me fariam muito mal. Mas esse é só um palpite que eu carrego comigo na hr de ir escolhendo meu caminho.
(Esse ser humano é um bixinho que gooosta de dar um palpite...)
Quanto ao blog, as vezes tenho vontade de super escrever e me dedicar, mas no fim vejo ele mais como uma coleçãozinha minha, de coisas que me agradam e me ajudam nessa seleção de caminhos. Uma coleção que compartilho. Conversas assim só se despertam em mim quando tem um outro interessado nos meus achismos da vida e do mundo. Nesse caso você. ;)
Sabe Gabriela, em madrugadas como a de agora, me pego passeando em blogs, como o seu, não esperando encontrar um 'e agora Maria-Jose?' como esse, mas p/ tentar entender o pq de tudo isso. O pq q me sinto tão oprimido por essa contemporaneidade materialista, antropocentrica, destruidora de valores que tomou conta de tudo. O pq q os academicos de filosofia tem se dedicado cada vez mais em decorar teses alheias do que compor suas idéias (uma omissão hipócrita, acredito q por medo). E olha, isso é preocupante, o libido é fator decisivo... A individualidade p/ mim sempre foi algo sensivel, inocente de cada um, mas a individualidade hj está dividida, como mensiona o texto, ela se compõe de uma reação, não da ação necessariamente concebida. Mas, vamos tentando, já q o porvir é virtual e o agora por sí só, já é passado, viva HJ!! (rsrs), grande Abraço.
Poxa, que legal, outro leitor que não os meus queridos e conhecidos Rica e Rubinho! Pena que preferiu não se identificar.
Mas de fato, sabe que esse tema da academia têm me incomodado um bocado ultimamente. É complicado enxergar o quanto os sentidos do aprendizado, do interesse pelo mundo e pela vida em si acabam inúmeras vezes, sobretudo no ambiente acadêmico, se instrumentalizando pra construção de mais verdades, mais do mesmo sobe a roupagem requintada do erudito. Sinceramente, e por conviver nesse meio, isso tem me exigido muito ultimamente. Todo esforço de analise, de investigação, exige, naturalmente, um esforço de distanciamento, mas acho muito complicado quando a gente perde a medida desse distanciamento, necessário à priori, e acaba assumindo um ponto de vista judicioso do que incomoda a gente. Que é o que falei quanto à atitude da academia. E a gente cai muito nisso. Quando paro pra observar fico impressionada no quanto é fácil e natural pra gente esquecer que também fazemos parte desse todo, de que se distanciar vale a pena pra identificar o problema, mas não pra assumir esse lugar confortável e pretensioso de inquisidor. Eu vejo essa nossa atitude como ‘O’ problema, sério mesmo. E temos que lutar muito contra isso, porque, ao meu ver, é um dos pontos principais pelo qual, as vezes, passamos tanto tempo correndo atrás do nosso próprio rabo. Que, no caso, é uma metáfora ótima, aliás, essa imagem de um cão que persegue algo estranho á ele, mas que na verdade é o próprio rabo! Porque o problema é que a coisa se acomoda na nessa energia de desanimo de frustração, numa atitude blasé com relação à tudo.
Uma coisa é ponderar, entender as polaridades que se apresentam, problematizar a coisa, outra é ficar na constatação morna. Também acho complicadíssimo o ativismo exagerado, mas pelo menos ele carrega uma centelha de potencia de vida, que pra mim, torna essa coisa estranha que é a vida, o nosso desamparo diante dela, numa coisa menos sofrida.
Por isso, contra a falta de animo, pra encarar essas complicações que a gente cria social e culturalmente, tenho procurado pensar no que se apresenta pra gente sempre com uma oportunidade de mudança, de transformação, da qual nós estamos integrados, influenciamos e somos influenciados. Transformação não no sentido da verdade, do certo, mas do que nos pode ser melhor do que. Nunca vai ser 100%, pq esse 100% a gente não conhece como experiência, conhece como idéia, como ideal, que pode ser um norte, mas o Norte como notação é notação, é uma idéia, uma abstração, completamente diferente do que é a experiência de caminhar no sentido norte. E voltamos a conversa sobre o domínio da razão sobre a experiência.
Não sei se ficou confuso, mas se ficou, então está claro!
rrsrsrs... Ai, ai, eu se divirto!
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